NÃO
RENATO SÉRGIO DE LIMA - TENDÊNCIAS/DEBATES - A POLÍCIA MILITAR DEVERIA SER EXTINTA?
Reforma e controle, não extinção
O debate sobre a extinção das polícias militares reabre, mais uma vez, a ferida do colapso da segurança pública no Brasil.
De
um problema social de primeira grandeza, a segurança teima em ser
relegada à condição de pária político, da qual grande parcela dos
políticos procura manter uma distância regulamentar ou, se a assume em
seus discursos, é para explorá-la a partir do culto ao ódio ou do medo
da população.
Afinal,
a violência urbana persiste como um dos mais graves problemas sociais
no Brasil, totalizando mais de 800 mil vítimas fatais nos últimos 15
anos.
Nosso
sistema é caro, ineficiente, capacita e paga mal os policiais e convive
com padrões operacionais inaceitáveis de letalidade e vitimização
policial.
Em suma, não conseguimos oferecer serviços de qualidade e, com isso, reforçamos a perversa desigualdade social do país.
É
fato que a história recente da segurança pública no Brasil tem sido
marcada por demandas acumuladas e mudanças incompletas. Ganhos, como a
redução entre 2000 e 2011 dos homicídios em São Paulo, tendem a perder
força, na medida em que não há normas técnicas, regras de conduta ou
padrões capazes de modificar culturas organizacionais ainda baseadas na
defesa do Estado e não da sociedade.
As
instituições policiais e de justiça criminal não experimentaram
reformas significativas nas suas estruturas. Avanços eventuais no
aparato policial e reformas na legislação penal têm se revelado
insuficientes para reduzir a incidência da violência urbana, numa forte
evidência da falta de coordenação e controle.
Por
isso, falar em extinção das polícias militares reduz essas questões a
um jogo truncado por defesas corporativas e agendas técnica e
politicamente enviesadas e parciais, que podem, mesmo que
involuntariamente, mais contribuir para a manutenção do atual quadro do
que para transformá-lo.
Resultados
perenes só podem ser obtidos mediante reformas estruturais do sistema
de segurança pública e da Justiça criminal, bem como do efetivo
comprometimento político dos Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário.
Essas reformas devem envolver a construção de um verdadeiro Sistema Único de Segurança Pública no Brasil, que tem de:
- Atualizar a distribuição e a articulação de competências entre União, Estados e Municípios;
- Criar mecanismos efetivos de cooperação entre eles;
- Reformar o modelo policial estabelecido pela Constituição para promover a sua maior eficiência;
-
E estabelecer requisitos mínimos nacionais para as instituições de
segurança pública no que diz respeito à formação dos profissionais, à
prestação de contas, ao uso da força e ao controle externo.
É
em torno dessa agenda que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública
propôs a criação de uma comissão de especialistas para subsidiar
mudanças legislativas necessárias à sua viabilização, bem como a
articulação de um novo pacto republicano de Poderes para a efetivação
prática dessas mudanças.
STF,
CNJ, governadores e presidenta da República também têm um papel
político que supera em muito os aspectos técnicos e gerenciais
envolvidos.
Tal agenda é capaz de surtir efeitos muito maiores do que a extinção de uma ou de outra polícia.
Se,
para Hannah Arendt, a violência aniquila a política, manter o nosso
atual modelo de segurança pública significa a nossa capitulação frente
ao medo, a insegurança e a vontade de vingança.
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