Todos sabem que
a Constituição proíbe a greve aos militares - no que, aliás, está muito
correta. O problema é que os PMs são, para todos os efeitos,
equiparados aos membros das Forças Armadas. Mais do que isso, as
próprias Polícias Militares são consideradas forças de reserva do
Exército e estão, em última instância, a ele subordinadas. Então, é como
se os PMs não fossem policiais, mas "militares". Tratamos, aqui, de
entulho autoritário que precisa ser removido. Policiais - militares ou
civis - são trabalhadores como quaisquer outros e precisam dos mesmos
direitos trabalhistas. Em se tratando de serviço essencial, eventuais
greves devem obedecer ao imperativo de manutenção dos serviços
emergenciais - como ocorre na área da saúde, por exemplo.
Recusar aos PMs o direito à sindicalização e a outras garantias básicas
da convivência democrática é erro de gravíssimas conseqüências.
De plano, a
vedação transforma qualquer manifestação reivindicatória - ainda que
pacífica e ordeira - em infração disciplinar e mesmo em crime militar; o
que as empurra para a ilegalidade e para os "desvios secundários" desta
condição (como, por exemplo, o anonimato, as práticas conspiratórias,
etc.). Sem a experiência de uma cidadania plena e submetidos, não raro, a
relações de desmando e de humilhação por seus superiores, os PMs vivem a
condição da desigualdade e da violência em suas próprias corporações e é
nesta linguagem que são (de)formados. A conta será paga em cada
abordagem policial, como de costume, pela população mais pobre, pelos
negros e pelos suspeitos de sempre. O ponto que desejo destacar aqui,
entretanto, é que a democracia brasileira não entrou nas PMs e nela não
entrará enquanto o modelo de polícia que temos não for profundamente
alterado.
Enganam-se os
que pensam que as greves dos PMs no Brasil expressam tão-somente
demandas salariais. Os salários-nada-essenciais pagos aos praças, assim
como aos policiais civis não-delegados, são, é claro, o tema
emergencial. Mas, para além disso, os trabalhadores da segurança pública
querem ser ouvidos e estão em busca de respeito. Alguns entre eles, por
desespero ou oportunismo, cometem neste processo atos inaceitáveis que
devem merecer a devida resposta jurídica. Mas não se pode "enquadrar" as
aspirações de centenas de milhares de policiais aos atos reprováveis
praticados por uma ou outra liderança - que, possivelmente, nunca teriam
alcançado protagonismo em uma dinâmica de mobilização sindical.
A condição
humana dos policiais brasileiros tem sido historicamente aviltada. Não
apenas pelo descaso dos governantes - sempre sensíveis aos pleitos dos
poderosos e daqueles que estão no topo da pirâmide salarial - mas também
por um modelo de polícia ineficiente e irracional que não oferece aos
bons policiais qualquer perspectiva de dignidade e reconhecimento. O que
as greves das polícias estão nos dizendo é que a paciência do "andar de
baixo" - pelo menos nas polícias - se esgotou. O que, desde uma
perspectiva histórica, costuma ser uma boa notícia.
Marcos Rolim - rolim.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário